segunda-feira, 20 de maio de 2013

Reportagem 360 graus: As diferentes caras de um assunto



Por Thiago Domenici - Observatorio da Imprensa - edição 575 - 02/02/2010

Felipe Lloreda é um jovem jornalista colombiano. Atendeu o pedido desta entrevista com a mensagem "con mucho gusto". Diretor de Novos Meios do El País, da Colômbia, nesta conversa o assunto é reportagem 360º. "Reportagem o quê?", você pergunta. Uma explicação: "É a reportagem onde graficamente podem-se visualizar as diferentes caras de um assunto", diz Lloreda. Criado em janeiro de 2009, o projeto completou seu primeiro ano de vida. As três reportagens disponíveis – a primeira "Cali, la ciudad que no duerme", a segunda "La hoja sagrada" e a terceira "Cali, una industria salsera" – são de arrepiar.
Difícil explicar o que será o futuro do jornalismo com tanta inovação. Essa, no entanto, é merecedora do destaque tamanha a qualidade do que fazem usando áudio, vídeo, texto e muita criatividade e bom gosto. É a tecnologia a favor do bom jornalismo. Sem mais, é preciso ver, brincar e descobrir o que no Brasil ainda não existe ou não se descobriu. Aqui, sem pretensões, esta novidade dos vizinhos periodistas da Colômbia.
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Conceitualmente e praticamente, o que é e como surgiu no cotidiano de vocês a reportagem 360º? Em que categoria de informação poderíamos enquadrar o que vocês fazem? Jornalismo interativo? Multimídia? Ou reportagem 360º é uma nova categoria? 
Felipe Lloreda – É uma nova forma de informar, a partir de todos os ângulos. Surge da necessidade de provocar impacto e de nos ajustar aos usuários de hoje, àqueles que estão navegando em sites onde se obtêm uma experiência virtual. É jornalismo interativo. É multimídia. É um pouco de tudo. É também uma aposta para conseguir mais visitas ao jornal diário tradicional online. A categoria: inovação jornalística, aproveitando todas as ferramentas que existem na web, por isso chama-se 360º. Porque graficamente podem-se visualizar as diferentes caras de um assunto.

Interativo e moderno
O conceito de reportagem jornalística tradicional pressupõe volume de informações, profundidade do tema, apuração, de preferência, no local, muitas entrevistas, em alguns casos vivência da pauta e fotografias relevantes e bem feitas. Como definir o tipo de reportagem proposto por vocês? No que ela se diferencia da reportagem jornalística tradicional além da utilização e interação de outras mídias?
F.L. – O tipo de reportagem é documental aproveitando as ferramentas da web possíveis, onde a forma se converte em protagonista e o fundo é secundário. Por isso, quando pensamos na produção de um conteúdo, planejamos primeiro desde o ponto de vista visual, não necessariamente jornalístico. Devem-se imaginar tudo. É fazer documentários com interação e participação.
Desde quando existe a reportagem 360º? Existem outros projetos como o de vocês? Onde se inspiraram?
F.L. – Nasceu como projeto em janeiro de 2009, pela necessidade de inovar e tem como modelo a "Repórter Índigo", um web site, de estilo revista-virtual espetacular do México, que foca na investigação ou denúncias temáticas conjunturais primordialmente e apresentando-as em formatos digitais inovadores. No mundo existem os especiais que desenvolvem o Clarín da Argentina, HBO, Olé, Mediastorm e New York Times.
A qualidade estética é especialmente chamativa no trabalho. Usam muitos efeitos sonoros, muitos vídeos, áudios, fotografias. O texto, no trabalho da reportagem 360º, não parece ser o eixo principal, mas parte do conjunto da obra. É isso mesmo? É o jornalismo que vocês acreditam para o futuro?
F.L. – Para nós, é uma forma de fazer jornalismo interativo e moderno. Não sei se é o futuro, mas está prendendo a atenção dos usuários, inovando, impactando e gerando muitas opiniões positivas.

Orçamentos de publicidade, só em 2010 
Pensando no longo prazo, onde vocês querem chegar com este trabalho? Torná-lo cotidiano e popular depende, sobretudo, de uma maior acessibilidade à internet nos termos da inclusão digital. O que pensam a respeito? 
F.L. – Queremos chegar a fazer uma reportagem quinzenal porque transformar em algo cotidiano perde sua especialidade. Além disso, os navegantes demoram em consumir e apreciar a reportagem. Eles consomem por espaços, dias, semanas... No caso da Colômbia, a acessibilidade da web já chegou a metade da população e cresce em grandes medidas. Então, cada dia que passa mais gente vai poder ver nosso especial.
Acho que o equipamento que vocês usam não é algo muito caro que impeça que a grande maioria dos jornais da América do Sul também os tenha. Porque então não existem mais projetos como estes? Existem resistências dos jornalistas para fazer este tipo de reportagem? O público também apresentou resistência a esta linguagem?
F.L. – Os jornalistas, engenheiros e designer deste projeto são independentes do impresso. É um time separado, mas que gradualmente tomaram empatia pelo 360º. O tradicionalismo foi um obstáculo que enfrentamos em algum momento ("estávamos loucos!"). No entanto tudo é um processo. Já a redação do jornal está muito mais envolvida em nosso projeto e temos um plano de integração com eles para fazer trabalhos em conjunto e aproveitar sinergias.
Qual foi a resposta que vocês receberam do público, de outros jornalistas e dos anunciantes a respeito das reportagens? Financeiramente para vocês já é rentável? Tem um custo alto fazer este tipo de trabalho? 
F.L. – O público adora isso! Incremento de visitas, usuários e felicitações dos jornalistas da web, de outras mídias. Financeiramente ainda não é rentável. Só começaremos a fazer orçamentos de publicidade em 2010. Embora nunca tenha nascido para ser um produto comercial.

Programa mais comum é Flash 
Quanto tempo leva fazer uma reportagem assim, desde a ideia até sua publicação? Quantas pessoas estão envolvidas (trabalham unicamente na reportagem 360 ou também no jornal impresso ou online)? 
F.L. – Demoramos um mês para fazer tudo. A pré-produção, produção, edição e teste. No entanto, temos um plano de conteúdos criativos que não são conjunturais, que vamos trabalhando cada um independentemente. Contamos com um grupo de um engenheiro, três designers web, três jornalistas, um fotógrafo, um editor de multimídia e eu, o diretor da área. Este grupo trabalha exclusivamente no 360º. Mas em 2010 teremos um grupo inteiro de novas mídias no El País S.A. gerando reportagens. Somos 19 no total.
O que é preciso para fazer estas reportagens? É preciso que os repórteres sofram uma grande mudança para comunicar-se através desta linguagem? O que é preciso para um repórter trabalhar neste formato?
F.L. – São repórteres web que pensam diferente, ou seja, em outro formato. Não levam gravadores e, sim, câmeras digitais e vídeo câmara. E são todos guiados pelo editor multimídia, quem conceitualiza quase todo o site com seus designers. Os jornalistas tradicionais normalmente não trabalham neste tipo de produto jornalístico. No entanto, no processo de integração estamos treinando vários. Hoje temos dois jornalistas que saíram do impresso.
Os computadores com capacidade de processar vídeos estão cada vez mais acessíveis. Este tipo de linguagem se tornará mais comum? 
F.L. – A maioria é [o programa] Flash. É muito acessível.
Que número de visitas vocês tem e como navega o público pelo site?
 F.L. – O público experimenta o site navegando. Não existe uma ordem, é de acordo com cada navegante e sua forma de pensar. As visitas variam entre 250 mil usuários até 500 mil, dependendo da temática.
Já cogitaram fazer versões traduzidas ou legendadas do trabalho de vocês para ganhar novos públicos? Inglês? Português etc.? Ou mesmo espalhar o conceito para outros países?
F.L. – Não. Mas você acabou de me dar uma excelente ideia. Muito obrigado!

Prezadas e Prezados, dêem sua opinião sobre as questões aqui levantadas e como vocês poderiam se posicionar neste cenário.